terça-feira, maio 30, 2006

inSolidez

Para ouvir: Sétima Legião "Por tua imensa saudade"
Senti o chão passar como uma vertigem pelos meus pés, não sei quantos dos degraus que subi me escorregaram sob o corpo. No inicio senti a dor, depois a dormência, no final só pensava que tinha de acabar. Por fim o meu corpo parou de deslizar pelo frio do chão, talvez porque tenha encontrado uma parede que a velocidade da queda não conseguiu trânspor. Não sentia nada além da força que fazia para respirar. Os meus olhos estavam fixos na cor amarelada do tecto, conseguia ver ainda o inicio do corrimão, parecia tão sólido que não entendia como pode ele escorregar-me da mão. Sentia-me desconfortável, mas tinha tanta preguiça em me mover, estava a ficar com tanto sono. Não me recordava há quantas horas estava acordada, não sabia se era lógico estar a lutar para não adormecer. Fiz um esforço por mover os lábios, para conseguir chamar alguém, ou pelo menos emitir um som para saber como ia a minha voz chegar aos meus tímpanos, para ter a certeza que ainda estava viva. Depois percebi que já tinha os lábios entreabertos porque senti o calor húmido da minha língua a passar por eles... e foi quando percebi que algum daqueles degraus me tinha roubado a voz! Ouvi uns passos, senti-me aliviada por notar que ainda conseguia ouvir, ou será que era o som do meu corpo a desprender-se de mim!? Mas e os passos, porque já não os ouço? Foi então que o bater de uma porta me roubou a última esperança, era mais uma porta que se fechou e talvez já só abrisse tarde demais. Esperei mais um pouco... depois pensei que talvez já me conseguisse mover, afinal já tinha descansado um pouco (ou talvez umas horas, não sei) Experimentei uma sensação calma de anestesia... Não, não me vou mover. Acho que vou dormir um pouco!

segunda-feira, maio 29, 2006

Ao 5º Passo

Para ouvir: Yann Tiersen "Comptine d'une autre été"
Bateu a porta atrás de si, entrou em casa e sentiu o cheiro familiar do que costumava ser o calor porque esperava o dia inteiro por voltar a sentir. Olhou á volta e viu tudo no seu exacto lugar e invadiu-o a saudade da forma como antes gostava do que via. Deu dois passos, sabia movimentar-se naquele espaço de olhos fechados, experimentou fecha-los... recordou com as mãos apertadas em dor que visão outrora teria quando os abrisse. Um a seguir ao outro chegou ao quinto passo. Abriu então os olhos! Sabia de cor a disposição dos móveis que o rodeavam, mas sabia que a figura humana que se destacava á sua frente teve em tempos um sorriso. Olhou para ela com uma expressão glaciar, se algo nele fosse lido numa mais comum expressão facial ele seria derrotado pelas palavras que presas na língua nunca conseguiria dizer. Os lábios dela moveram-se ameaçando soltar no ar alguma palavra, ele estremeu com aquele breve momento, já conseguia ouvir o ressoar do fracasso muito antes de ele começar a bramir. Uma lágrima escapou tão brilhante quanto inesperada dos seus olhos quase sem cor, a sua mão cortou cada milimetro de ar até conseguir pedir á figura inerte á sua frente que não começasse a falar. Com um braço esticado na sua direção a figura parou de o acusar; cravou os olhos no tapete que tantas vezes sentiu o cheiro do seu amor e ficou estática; a três passos do quinto passo que ele deu desde a porta por onde entrara. Com a voz trémula e vazia de emoção disse-lhe "Fiz o juramento que sempre te diria a verdade, e que te consolaria com a mentira." Ela sentiu-se apertada entre os maxilares de um lobo, nua exposta e ferida. Toda a sala parecia embaraçada de presenciar aquele momento e o tempo sentia estar proibido de passar por ali. "Sei o que sinto, o que te fiz e sei que te amo". Ela que parecia embrulhada numa fita invisivel, sentiu desembaraçar-se dela num estalar de dedos. Deslizou os pés pelo tapete saudoso deles e ao décimo passo parou, pegou numa pedra translúcida com umas letras de amor gravadas num momento em que nem elas chegavam para o que ambos sentiam. Num impeto atirou-lha com toda a raiva que sentia, não por desprezo por ele mas sim por si mesma, por saber que lhe perdoaria. Ele desviou-se e com um silvo a pedra rasgou-lhe o ar nos ouvidos, a voz dela quebrou a violência do momento "ai tens mais uma pedra no nosso caminho". Ainda desiquilibrado focou-a e já direito disse-lhe "Se eu olhar para essa pedra como um tesouro saberei que estou cercado deles e se, como a qualquer pecador, me forem atiradas mais pedras estarei a receber diamantes e ouro". A voz dela já não cabia na sua garganta e a multidão das palavras esmagavam-se para sair, mas inibidas pelo pressentimento da resposta fechavam-se em si. Foi sem ar no peito e com as náuseas provocadas pela mágoa de não saber como chegar até ela que disse "eu quero ir" com a mão ainda a tremer pegou num lenço de cor viva que desafiava todo o ambiente que o envolvia, levou-o ao rosto e limpou a ultima lágrima. Tudo isto sem nunca ter saido do quinto passo onde chegou de olhos fechados. Endireitou-se tanto quanto os seus musculos lho permitiam e ao sair sentiu-se como um grão de areia a brilhar no deserto... orgulhoso por saber que na sua ausência o deserto ficaria mais pequeno.

(To:..........Porque a dor do que vai acontecer é um adormecimento dela mesma)

quinta-feira, maio 18, 2006

Nas tuas asas

Para ouvir: Neil Young "Philadelphia"
Fazes-me lembrar as fadas das histórias que ouvia quando era uma criança! Mas a natureza não te deu asas...no entanto eu sinto-as. Sinto o bater das tuas asas, que passa pelo meu rosto numa suave brisa, e se aloja no meu coração com um calor reconfortante.O que provocaste na minha vida foi um efeito borboleta, porque o teu simples bater de asas, no fundo da rua que é tua e que é minha, levou até mim a calma que há anos procurava. Recebes-me com um sorriso, dás-me a tua voz que me mergulha nos timpanos com a sensação dormente da suavidade que tem, vens e caminhas a meu lado com a leveza da borboleta que te negaram a ser. És a pureza num corpo frágil, capaz de ser tornar em Hércules para defenderes quem te vê com as asas que sombreiam e emolduram as tuas costas!
(To: A minha Vânia...que tem sido tanto para mim) OBRIGADO

sábado, maio 06, 2006

Em ti

Para ouvir: Smashing Pumpkins "Farewell and Goodnight"
Hoje fizeste-me tão bem...
Vi-te chegar, reconheci o teu corpo mesmo quando era só uma sombra á distancia. Via os teus pés moverem-se, calcarem a relva fresca e alta e trazerem-te até mim. A cada passo que te aproximava mais de mim era menos uma pontada gelada de medo que vibrava violenta no meu corpo. Tinhas os olhos pegados no chão, as mãos afundadas nos bolsos e um sorriso que teimava em não se dar a conhecer. Foi então que em esforço levantaste os olhos, que insistiam numa trajectória no chão, e me viste. Eu estava sentada num frio banco de pedra, que me pareceu delicado como algodão assim que começaste a fazer parte daquele cenário, assim que soube que o ia partilhar contigo. O sorriso que francamente me dedicaste, foi tão inesperado quanto saboroso. Ouvi a tua voz, aquela voz serena e tentadoramente arrastada que conhecia desde o inicio, mas que há muito não ouvia. Sentaste-te ao meu lado, ao olhar-te vi-te indefeso, percebi que vieste até mim sem o peso do medo que te afastava de nós. Envolveste-me nas mãos que pensava já não serem minhas e puxaste-me até ti, senti o cheiro do teu perfume e pensei que nunca nenhum outro aroma me tinha confortado tanto; mas foi quando o meu rosto repousou no teu ombro que soube que era ali que queria morar... eternamente em ti!

segunda-feira, maio 01, 2006

O sal que bebo

Para ouvir: Antony and The Johnsons "The Lake"
Como gostaria de conhecer-te....
Como gostaria de te perceber... Como gostaria de te sentir presente e vivo... como gostaria de me sentir presente, viva e cheia de tudo aquilo que me deste a conhecer. Como gostaria que fosses meu como eras, como gostaria que o teu toque não fosse só uma recordação! Como gostaria de escrever aqui todos os momentos bons que passamos juntos, como gostaria de saber que era verdade quando os lesse, e quando tu os lesses! Como gostava de sentir nos meus lábios o teu beijo... e não o frio salgado de uma lágrima que choro quando me lembro de ti... e se me lembro sempre de ti... quanto sal eu não bebo!